Vénus (de)Partida - Quadros Meus 1


Na flor da juventude via o mundo assim... Lindo, de cristal... mas estaladiço. Tudo era sentimento, tudo era delicado, mas também era força e paixão.

O principezinho


- Anda brincar comigo - pediu o principezinho. Estou tão triste...
- Não posso ir brincar contigo - disse a raposa. - Ainda ninguém me cativou...
...
-O que é que "cativar" quer dizer?...
-Quer dizer que se está ligado a alguém, que se criaram laços com alguém.Laços?Sim, laços - disse a raposa. - ...Eu não preciso de ti. E tu não precisas de mim... Mas se me cativares nós precisaremos um do outro. Serás para mim único no mundo e eu serei para ti, única no mundo...
....Tenho uma vida terrivelmente monótona... Mas se tu me cativares, a minha vida fica cheia se Sol. Estás a ver, ali adiante, aqueles campos de trigo? ... não me fazem lembrar de nada. É uma triste coisa! Mas os teus cabelos são da cor do ouro. Então quando eu estiver cativada por ti, vai ser maravilhoso! Como o trigo é dourado, há-de fazer-me lembrar de ti...-Só conhecemos as coisas que cativamos - disse a raposa. -
...
...assim que o principezinho cativou a raposa.
E quando chegou a hora da despedida:
- Ai que vou chorar! Lamentou-se a raposa..
- A culpa é tua - disse o principezinho -eu não queria fazer-te mal, mas tu quiseste que eu te cativasse.
- Sim - concordou a raposa.
- Então não ganhaste nada com isso!
- Ai isso é que ganhei! - disse a raposa. - Por causa da cor do trigo...Vês , ali, os campos de espigas? Eu não como pão. Para mim o trigo é inútil. Os os campos de espigas nunca significaram nada para mim. E isso é muito triste! Mas tu... Tu tens o cabelo cor de ouro.Quando te tiveres ido embora, o trigo dourado fará lembrar-me de ti. E pela primeira vez amarei o ruído do vento no trigo...
-Adeus - disse o principezinho.
-Adeus - disse a raposa, e ficou durante muito tempo a olhar extasiada para os campos de trigo e a ouvir o vento assobiar entre as espigas.
Então o principezinho seguiu o seu caminho e notou com alegria que cada árvore lhe recordava a cor do pelo da sua amiga raposa.


Antoine De Saint-Exupery



Príncipe e raposa não seguiram juntos...
Mas...
Que bom que seria
.........não ter de olhar o trigo ... nem as árvores...

O som do nada



.

Quero ouvir a voz do nada

.
nos silêncios da minha vida

.
escutar o som do que corre lá fora

.
dizendo e lembrando...

.
................aqui e agora !

Pôr-do-sol


.
Quando o sol se puser
...........pela ultima vez
........................
para mim

......................que seja assim

Um dia
Foste vida
Foste luz
Foste flor

Hoje
(talvez não saibas)
Viveste
És mãe
És amor

Sementes




Era uma vez um homem...
que apanhava diariamente o autocarro para o trabalho...
Após a primeira paragem, subia uma senhora que se sentava ao lado da janela. A senhora abria a carteira e durante todo o trajecto atirava algo pela janela. Fazia sempre a mesma coisa e, um dia, o homem intrigado, perguntou-lhe o que estava a atirar pela janela.
- São sementes, respondeu-lhe a velhinha.
- Sementes? Sementes de quê?
- De flores. É que olho lá para fora e está tudo tão vazio...
Gostaria de poder viajar vendo flores durante todo o caminho. Não acha que era bonito?
- Mas as sementes caem na estrada. Os carros destroem-nas, os pássaros comem-nas... Acha que as suas sementes irão germinar em todo o caminho?
- Claro que sim! Mesmo que algumas se percam, outras irão para a terra e, com o tempo, crescerão.
- Mas... Demorarão a crescer, precisam de água!
- Eu faço aquilo que posso, os dias de chuva hão-de vir!
A velhinha seguiu com o seu trabalho ...
E o homem saíu do autocarro para ir trabalhar, pensando que a senhora tinha perdido um pouco do seu juízo .
Uns meses depois...
Quando ia para o trabalho, o homem, ao olhar pela janela viu todo o caminho cheio de flores... Era uma verdadeira paisagem colorida de flores!
Lembrou-se da idosa, mas já há alguns dias que não a via. Perguntou ao motorista:
- A senhora das sementes?
- Coitada, morreu o mês passado.
O homem sentou-se novamente e continuou a olhar para a paisagem, pensando:

«As flores nasceram, mas para que serviu todo esse trabalho, se não pôde ver o resultado?».

De repente, ouviu o riso de uma criança.
Uma menina apontava entusiasmada para as flores...
- Olha pai! Olha tantas flores bonitas!
*
Não é preciso explicar a moral desta estória, pois não?
A velhinha desta fez o seu trabalho, e deixou a sua herança a todos quantos a puderam receber, a todos os que puderam contemplá-la e ser mais felizes.
Dizem que o homem, desde aquele dia, faz a viagem de casa para o trabalho com um saco de sementes que...